Durante uma conversa com um parente mais velho, ficou claro como a palavra “subúrbio” ainda carrega, para algumas gerações, uma conotação negativa. A conversa, que começou sobre a Zona Oeste do Rio de Janeiro, acabou se estendendo até Campos dos Goytacazes. Ao mencionar a região de Guarus, essa visão pejorativa se manifestou de forma explícita, usando o termo como sinônimo de um lugar habitado por “gente simples”. Essa percepção está imbuída de fatores classistas. Ainda assim, a ideia de ampliar a noção de subúrbio para Campos me pareceu fascinante, sobretudo quando associada ao orgulho de ser formada por pessoas da classe trabalhadora.
Enquanto, no Rio de Janeiro, o subúrbio se desenvolveu historicamente ao longo das linhas de trem, em Campos dos Goytacazes propomos uma abordagem diferente: recorrer a elementos do imaginário para identificar o que poderia ser considerado área suburbana. Essa escolha se justifica pelo nosso desconhecimento da importância do transporte ferroviário urbano como eixo estruturante do espaço de Campos — com exceção do uso urbano registrado em 2007, quando ocorreu a queda da ponte do Ferreira Machado.
Para essa identificação, sugerimos quatro critérios principais: (1) a distância em relação à rodoviária; (2) a presença de moradias sociais; (3) a existência de áreas não consolidadas nas proximidades; e (4) a densidade demográfica.
Embora a predominância de espaços construídos por meio da construção civil informal — em contraste com a atuação de incorporadoras — seja um aspecto relevante para a compreensão do processo de suburbanização, optamos por não adotá-lo como critério nesta postagem, em razão da complexidade que o tema exige. Ainda assim, é importante destacar que a presença de unidades habitacionais financiadas pelo programa Minha Casa, Minha Vida introduz nuances significativas a esse critério. Isso porque, embora essas moradias não sejam fruto da autoconstrução tradicional, muitas vezes se inserem em contextos suburbanos, caracterizados por limitações na oferta de infraestrutura e serviços públicos.
Enfim, vamos ao que importa. No critério da distância, adotamos como referência tudo que se encontra além de um raio de 7,5 km traçado entre a rodoviária de Campos e a localidade de Terra Prometida — área que, embora distante do centro, ainda mantém continuidade na mancha urbana. Em relação às moradias sociais, tomamos como base os conjuntos habitacionais do programa Morar Feliz, implementado pela Prefeitura de Campos, cuja distribuição nos bairros indica a presença de políticas públicas de habitação popular, similar ao que ocorre em parte do subúrbio carioca (como Cidade Alta, Cidade de Deus e Vila Kennedy). Embora não tenhamos pesquisado todos os locais contemplados em Campos, temos uma ideia geral sobre alguns deles. Quanto às áreas não consolidadas, apesar de existirem em grande extensão dentro do raio central, fora dele as associamos à proximidade com a zona rural — situação que o subúrbio carioca também viveu em tempos passados, quando não era totalmente urbano nem rural. Por fim, a densidade demográfica foi observada por meio de um mapa oficial da Prefeitura de Campos, que evidencia áreas com alta concentração populacional. Ressaltamos que, no subúrbio do Rio de Janeiro, há uma associação comum com locais populosos. No nosso caso, escolhemos a densidade (população por área) por ser o dado disponível, mas o que buscamos expressar é a associação do “subúrbio” de Campos a locais de grande população, como ocorre hoje no subúrbio carioca.
Tomando esses critérios, é possível discutir as seguintes áreas:- Guarus: embora esteja inteiramente dentro do raio definido anteriormente, a grande concentração de moradias sociais, somada a uma população numerosa — especialmente no Parque Guarus —, permite considerar que parte da região poderia ser classificada como suburbana;
- Goytacazes (distrito), Travessão (distrito) e Ururaí: apresentam dois elementos centrais da suburbanização: a relativa distância em relação ao núcleo central da cidade e a proximidade de áreas ainda não totalmente consolidadas.
Enfim, em Campos, o subúrbio - que nem sabemos se existe de fato - não segue trilhos, mas se revela pela distância, moradias sociais, áreas não consolidadas e alta densidade. Inspirados no Rio, propomos um olhar extravagante sobre a urbanização.
Nenhum comentário:
Postar um comentário